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segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Cisne Negro

É mesmo bárbaro, visceral, percorre desde a criação neurótica da mãe insatisfeita que deposita todas as expectativas na filha como solução de suas frustrações até a esquizofrenia que acaba eclodindo deste processo, passando pela inveja, pelo projetar no outro o que não se consegue viver ou mesmo enxergar em si mesmo, pelo auto-flagelo a que pode chegar a luta pela perfeição, bela e deplorável, irresistível e repugnante. Vida e morte. O desfecho comprova um insight que tive outro dia: não vejo medo real da morte em si, o que vejo frequente é o medo de viver e de não viver. Medo da morte é propaganda enganosa feita pela parte podre das religiões para limitar o viver, encher seus cofres e lotar suas salas de pessoas sem respostas, até porque sequer têm a consciência de suas verdadeiras perguntas.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Tempo

Tempo, estranho tempo. O tempo que queremos ou o que acreditamos que algo deva durar quase nunca coincide com o tempo que acaba levando para as coisas acontecerem ou não acontecerem. Os espíritas vêm nos consolar prometendo que o tempo na vida encarnada é ínfimo, os iogues afirmam que o tempo é uma ilusão. Mas o tempo do nosso coração é bem real, dói e corrói, como também nos dá desfrute e constrói. Este componente da vida é inexorável e implacável e haja sublimação para relevarmos a existência de suas rédeas. Teríamos de nos libertar também de tudo a que a ele se condiciona. São tantas respostas diferentes e opções em que se crêem como verdadeiras, que no meu humilde pensamento limitado e sempre estreitamente ligado ao meu coração ardente, que a dúvida infelizmente permanece dominante. Doce dúvida cruel, o tempo dá e tira, o mundo dá voltas e novamente é 2ª feira para se ir trabalhar ou para se procurar emprego, para se pensar o que fazer quando não se precisa trabalhar. Não tenho respostas, só tenho dúvidas e às vezes até mesmo desespero, certezas quase nunca. Certeza é para os espíritos evoluídos ou para os que assim se consideram e podem se dar a este luxo. Não sou evoluído, nem pretendo. Os miseráveis deste planeta me parecem em sua maioria tão mais respeitáveis do que tantos que se vestem de certezas e se apóiam nas instituições estruturadas basicamente no acúmulo de dinheiro e poder. Eles sim são libertos do tempo, sabem que o tempo lhes fará pouca ou nenhuma diferença, correm atrás dele quando é necessário e o utilizam de forma relaxada sempre que podem. Serão eles os fracos? Ou os que precisam provar algo?

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Silêncio

Vinha no ônibus chacoalhando rumo ao trabalho. Os ônibus no Rio quando correm, o que é quase sempre, chegam a machucar a gente. Meu trajeto matutino é desde Copacabana até a Lapa, via Praia do Flamengo. Olhar encantado pela paisagem a partir da Enseada de Botafogo e corpo sofrendo com a sanha do motorista lutando contra o carro que parece prestes a desmontar. Ao menos venho sentado, saio ganhando na melhor de 3. É raro alguém puxar conversa, mas hoje uma senhora me deu alguns conselhos preciosos. Algo simples como valorizar a saúde acima de tudo, a paz e todas aquelas coisas meigas de vovó. Tem 85 anos e se orgulha de andar sozinha. Estava indo ao médico por rotina e demonstrava muita alegria, sem aquela coisa de carente. Sua energia era gostosa, envolta nos tons de rosa do seu elaborado figurino, cabelo pintado mantendo uma vaidade dentro do razoável. Suas recomendações não me eram inéditas, mas sabe quando voce precisa ouvir algo que, embora já saiba, reluta em se lembrar e a vida coloca alguém para lhe dizer? Fica meio cinematográfico assim, rodeado de certa magia, a sabedoria da idade surgindo casualmente e lhe dizendo exatamento o que voce precisa ouvir. O mais impressionante foi a sintonia que atingimos. Sua voz era fraca e no início eu precisei me esforçar para entender suas palavras. Valeu a pena fazer força, ela me transmitiu paz e serenidade singulares, em dez minutos me disse muito mais do que muitos supostos amigos conseguiram dizer em anos. Realmente preciso reavaliar minhas companhias... A cereja do bolo foi o conselho de que sempre, ou quase sempre, o silêncio fala mais do que qualquer palavra. O velho ditado: se a palavra é de prata, o silêncio é de ouro! Eu, que falo pelos cotovelos e não raro falo demais, vim quieto caminhando do ponto até o prédio feliz, bem melhor do que antes de encontrá-la e com vontade de cultivar o silêncio. O mais provável é que nunca mais a veja, mas sua figura terna me alimentou de esperança e virtude. Ao se despedir me desejou que todos os meus sonhos se realizem. Agradeço à vida por mais este anjo.

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Luxúria

A luxúria... nunca entendi por que é considerada um pecado capital. Sempre me atraiu muito e nela caí fundo, conheci seus porões e seus melhores aposentos. O prazer como meta até pode ser bem acolhido de um ponto de vista romântico e um tanto míope, imaturo. O prazer em si nem deve ser visto como pecado. O tema é complexo e longe de mim querer esgotar o assunto, mas tive um  insight que merece anotação. O problema da luxúria não é o prazer em si, mas a postura resultante de colocá-lo acima de todo o resto, condição que facilmente acaba por transformar tudo em egoísmo, esterilidade. Me vicio no prazer, como numa droga ou numa paixão. A razão desaparece gradualmente, me torno escravo dos desejos e nem percebo que jamais se saciarão. Demora às vezes uma vida inteira para que se perceba a seriedade de tal capricho, quando se consegue. A questão central da luxúria é que ela põe tudo a perder, cega quem a ela se entrega. O prazer não pode ser uma constante. O prazer e a felicidade devem ser pontuais, até para que possam guardar seu devido valor. O lugar onde faz sol todos os dias é o deserto, inabitável.

terça-feira, 10 de agosto de 2010

Antes só do que mal acompanhado

Ah, como entendo hoje o que isso significa! Como a inocência de estar carente nos fragiliza a compartilhar de não boas companhias. E é pena, enorme lástima mesmo que tenha demorado tanto para perceber isso. Embora antes tarde do que nunca, é preciso compreender qual a contrapartida do tempo aparentemente perdido. Penso que não existe tempo perdido mas sim mal compreendido.

Quem de nós já não se desgastou tentando na maioria das vezes em vão investir em algum sentimento inútil? Quantas vezes precisarei jogar na loteria para ganhar? Talvez jogue a vida toda e jamais ganhe, mas se não jogar é que não ganharei. Viver alimentados na esperança de que algum dia nossa semente lançada vingará... É preciso achar terra fértil. Desperdiçar as nossas melhores intenções em almas estéreis só trará dor, frustração, engano, vazio. E não adianta culpar o outro por não ser campo fecundo, ele desconhece sua condição. A negatividade não é nada senão a carência de positividade, tal como a escuridão é ausência de luz. Nossa é a responsabilidade por não perceber ou não aceitar a inutilidade de nossas insistências. A vida sempre dá um jeito de avisar, mas o teimoso sempre arranja um argumento para continuar a teimar. Aí é problema nosso descobrir o que nos faz persistir no inútil.

Está escuro, confuso e, paradoxal, incrivelmente coerente. É uma situação clara porque posso ver o quanto está turva. Quando tudo parece limpo não enxergamos nada sujo. Ledo engano, sempre poderá nos espreitar a confusão num momento adiante. Contínua surpresa, às vezes acho que prefiro manter alguma dose de sofrimento a me iludir que de ele não existe. O fato relevante é que podemos escolher, mas não devemos nos esquecer de que tanto a postura otimista quanto a pessimista nos deixarão sempre expostos ao risco. Especialmente em nosso tempo, respirar é arriscado e, diante disso, por nada vale a pena sofrer em demasia.

Ainda que muitas vezes não pareça a melhor opção, intuir é dar espaço ao mágico, que supera o lógico quase sempre, abre caminhos talvez aparentemente mais difíceis, mas ao menos a intuição é algo que brota do mais profundo ser.

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Superação

Dificuldades, traições, decepções, dependências de toda ordem, dissabores, tristeza.
Toda a parte desgradável da vida é preparação, o ganho é a superação.
Nos tornamos maiores e nos sentimos felizes quando conseguimos superar as etapas dolorosas.
E não tenho dúvida, superar é uma escolha.
Às vezes demoramos para ter este insight.
O amor perdido criará espaço para outro maior.
A traição ensina o que é boa parte da realidade humana.
A crise cria novas necessidades, abre outros caminhos.

Na leitura psicanalítica, voce acaba percebendo que boa parte dos obstáculos são escolhas suas.
Voce "cria" um problema para ter de resolvê-lo. Evoluímos constantemente nesta sequência.
O perigo maior é se viciar na dor, na tristeza, no vitimismo, se acomodar na incapacidade de superar.
Meu pai gostava de repetir o ditado: Deus nunca dá uma cruz mais pesada do que voce pode carregar.
Se lhe aconteceu, voce deve enfrentar. A superação é uma conquista compensadora.

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Citações - Jose Saramago

O homem é o único animal capaz de chorar. E de sorrir.
É diante do mar que o riso e a lágrima assumem uma importância absoluta.
Dir-se-á que mais profundamente a assumiriam diante do universo, mas esse,
Digo eu, está demasiado longe, fora do alcance duma compreensão comum.
O mar é o universo perto de nós.

*

Dentro de nós há uma coisa que não tem nome, essa coisa é o que somos.

*

Penso que estamos cegos,
Cegos que vêem,
Cegos que, vendo, não vêem

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Somos a memória que temos e a responsabilidade que assumimos.
Sem memória não existimos, sem responsabilidade talvez não mereçamos existir.

*

Nem a juventude sabe o que pode, nem a velhice pode o que sabe.

*

A vida é breve, mas cabe nela muito mais do que somos capazes de viver.

*

Fugir da morte pode tornar-se num modo de fugir da vida.
 
*
... enganadora é sim a luz do dia,
faz da vida uma sobra apenas recortada.
Só a noite é lúcida, porém o sono a vence,
talvez para nosso sossego e descanso,
paz à alma dos vivos.

*

Se tens um coração de ferro, bom proveito. O meu, fizeram-no de carne, e sangra todo dia.